quinta-feira, 16 de setembro de 2010

[25]

Só digo que vão querer matar alguém no final.

Tom andava atarefado de um lado para o outro do quarto apenas em boxers a enfiar uma data de roupa dentro de malas. Naquele dia tinham a primeira sessão fotográfica das 4 previstas, para fazer.
No momento olhava para um boné aos quadrados e outro negro, totalmente indeciso em qual levar. Decidiu pô-los à vez na cabeça e mirar-se ao espelho, constatando que ambos o deixavam todo bom e que o mais fácil seria depois perguntar ao irmão qual usar na altura. Encolheu os ombros e arrumou as últimas roupas na mala com o maior cuidado do mundo, afinal não se podia dar ao luxo de chegar lá com tudo amarrotado. “Devo ficar lindo a passar a ferro!” gargalhou consigo mesmo ouvindo no segundo seguinte alguma coisa a cair estrilhosamente no chão.
- Bill? – perguntou ao sair do quarto e olhar para o fundo do corredor onde o irmão, não sabia bem como, estava estatelado no chão à porta da casa de banho comum. – Bill! – chegou-se a ele.
- Oh, bom dia Tom! – disse, demasiado feliz.
- Estás bem, puto? – perguntou ajoelhando-se ao lado dele, preocupado.
- Ya. – disse descontraidamente.
- Ahm, então o que é que estás a fazer estendido no chão e que raio de barulho foi aquele? – perguntou olhando-o, examinando o seu corpo a ver se não tinha qualquer tipo de mossa ou arranhão.
- Barulho? – perguntou sentando-se de costas para Tom.
- Sim. Não ouviste?
- Eu não. – levantou-se de vez e entrou na casa de banho à procura de um perfume que por ali tinha deixado. Tom levantou-se também e voltou a passar os olhos pelo corpo de Bill. “Mas porque raio é que ele estava deitado no chão? Será que bateu nalgum lado?” perguntou-se. – Tom, eu sei que sou bom mas escusas de me estar a olhar minuciosamente, o que é que foi? – perguntou, baixando a cabeça até o seu olhar fixar o de Tom.
- Estás bem? – Tom perguntou, nem sequer ligando àquilo que o irmão dissera.
- Sim... – deu ênfase à palavra. – Que foi!? – deu-lhe um abanão com a mão, no ombro.
- O que é que estavas a fazer aqui deitado? – apontou o chão da casa de banho e do corredor, visto que Bill tinha as pernas no compartimento e o tronco fora.
- Estava a endireitar as costas. – respondeu com a maior naturalidade do mundo. – Era necessário uma superfície extremamente direita para isso. - Tom elevou a sobrancelha esquerda sem perceber patavina.
- E vens endireitar as costas para o chão frio em vez de o fazeres no tapete do quarto que além de quente é confortável? – perguntou, mais para si que para ele.
- Tenho calor e o tapete é quente. – respondeu virando-lhe costas. – Agora vai-te vestir que daqui a nada estamos mas’é atrasados! – disse abrindo o perfume para constatar que ainda cheirava bem. Entrou no quarto.
Tom ficou com cara de parvo a ver o irmão fechar a porta. “Han?” A sério o seu cérebro pouco capacitado no momento não tinha percebido a ligação entre as costas, o chão e o tapete. Mas certamente a culpa não era de Tom pois eu também não percebi.

Voltou ao quarto e, vestindo-se e arrumando as duas malas em condições, desceu ao andar de baixo para encontrar o seu adorado cão esparramado no sofá e a taça dos chocolates do Bill totalmente em cacos, sobre o tapete vermelho sangue.
- Ah! – exclamou, apercebendo-se de que provavelmente fora aquilo que ouvira partir-se uns minutos antes. O cão, que mantinha as quatro patas no ar enquanto dormia com a cabeça fora do sofá, mexeu-se ligeiramente ao ouvir a voz fina que saíra da boca de Tom com a exclamação. – O Bill vai-te matar. – riu-se olhando o animal às manchas.
- Quem é que eu vou matar? – Bill chegara no momento pousando as malas à porta da sala. Tom apontou os cacos. – Os meus chocolates!! E a minha taça preferida! – olhou Tom.
- Hey, não fui eu! – levou as mãos ao ar em defesa. Bill olhou o cão e seguidamente Tom outra vez. – Não sei, pergunta-lhe. – riu-se saindo da sala planeando ir comer qualquer coisa.
- Pergunta-lhe… pff como se ele falasse. – acenou negativamente com a cabeça e começou a apanhar os cacos e os chocolates, separando-os.
Tom voltou mas agora a comer uma sandes.
- Queres ajuda? – perguntou com um sorriso trocista.
- Parvo. – como se ele fosse mesmo ajudar! Dirigiu-se à cozinha. Tom sentou-se na parte do sofá que não estava ocupada pelo seu amigo de quatro patas e, ao pender a mão pelo braço do sofá sentiu o canino que pertencia ao irmão. Espreitou na sua direcção e a maneira como ele estava encolhido despertou a atenção de Tom, acusando-o.
- Foste tu, não foste? – perguntou-lhe e o cão ladrou por ele lhe ter, simplesmente, falado. Tom riu-se ao vê-lo desatar a correr assim que Bill apareceu novamente na sala. – Agarra que é ladrão! – disse apontando o cão. Bill riu-se da figura do irmão. – Ou culpado. – acrescentou para si, pensando melhor.
- Agarra tu que estamos atrasados! – disse-lhe ainda a rir. Tom levantou-se e, passando a mão pela barriga do animal ainda adormecido sobre o fofo sofá, dirigiu-se à saída.

(…)

Beatriz entrou no clube com um pressentimento fora do normal. Sentia o seu coração demasiado acelerado para aquilo a que vinha. No entanto, deixou andar talvez aquele nervosismo fosse apenas pelo facto de estar atrasada.

Desceu do palco na mesma acrobacia do costume e, tal como todas as outras vezes, imediatamente se encaminhou para o seu canto.
- Hannah. – a voz forte e autoritária de que tinha sido safa por Georg há uns dias atrás impunha-se novamente aos seus ouvidos e, desta vez, Beatriz não tinha saída possível.
- Sim? – virou-se para o puder encarar nos olhos. Não sabia como ainda conseguia olhar aquele tipo de maneira tão segura. Sentia as pernas tremer, sentia o coração acelerar e pelo seu pensamento passavam dois nomes: Tom e Ryan. Não sabia porquê mas naquela noite e perante aquele olhar o seu medo tornava-se maior por eles.
- Vem comigo. – sorriu-lhe e chamou-a com o dedo indicador. Beatriz seguiu-o até ao seu gabinete, umas portas mais à frente.
- Precisas de alguma coisa? – perguntou. Fosse pelo que fosse nunca o iria tratar por outra pessoa que não a segunda do singular, afinal tudo aquilo que ele já lhe tinha feito não mostrava qualquer respeito.
- Preciso de algo que só tu dás a este clube… - disse aproximando o corpo do dela, que mantinha vestido um mero soutien e umas meias de ligas vermelhas fixas às cuecas rendadas. - … sexo do bom. – Beatriz sentiu a sua espinha arrepiar e todos pêlos do seu corpo eriçarem. É que não lhe faltava mais nada! Conteve as lágrimas e o pensamento da violação. Não podia dar parte fraca, não podia fazer nada que a denunciasse. Por mais que quisesse sair daquele clube e por mais vezes que Tom lhe pedisse, Beatriz teria que aguentar a situação. Sabia que não era assim tão fácil de desistir, fugindo. Assim que Charles soubesse o que se passava (e era certo que não demoraria muito tempo) as vidas de Ryan e de Tom estariam em perigo e, isso, Beatriz não podia permitir.

Respirou fundo e sentiu as mãos de Charles agarrarem a sua cintura puxando o seu corpo contra o dele, farto e sem qualquer tipo de atracção física. Charles não tinha um bom porte físico, não tinha nada onde Beatriz pudesse prender os olhos e deixá-lo simplesmente tê-la. Era impossível contrariar uma situação daquelas com um homem daqueles. Simplesmente nojento, ao seu olhar.
Pousou as mãos nos ombros dele e ao ver a imagem de Tom passar-lhe pelos olhos empurrou-o contra a secretária. Parecia um filme.
- Hey! – ele, vendo que aquilo não fazia parte da brincadeira sexual que ela poderia querer jogar, rapidamente retomou o equilíbrio e a encostou à parede, agarrando-o pelo pescoço, como que a sufocando. Beatriz não teve sequer tempo de se dirigir à porta e sair a correr daquele bloco. – O que é que pensas que estás a fazer?! – perguntou encostando os lábios aos dela. Beatriz cuspiu-lhe. – Cabra! Que fazes!? – limpou a sua boca com a manga da camisa suja que vestia.
- Largue-me! – disse a custo tentando mover os braços, mas também ele os prendera atrás das suas costas com a mão livre.
- Não largo nada… - riu-se. - … apetece-me ser eu a requisitar-te por hoje achas que dá, docinho? – Beatriz cerrou os dentes e tentou mover mais uma vez as mãos, mas os seus pulsos estavam presos atrás das suas costas. Charles riu ao perceber que a rapariga estava inteiramente ao seu controlo. Atirou-a fortemente contra a parede e Beatriz caiu no chão, levando a mão ao ombro. Ele dirigiu-se à porta e trancou-a atirando a chave ao ar, nem dando tempo de ver onde tivera caído.

- Não sais daqui até eu ter o que quero. – olhou-a sentada no chão contra a parede e rindo-se da sua pobre figura, despiu-se completamente. Beatriz elevou o olhar e pôde observar mais uma vez o corpo que a invadira sem qualquer tipo de autorização há quase quatro anos atrás. Baixou a cabeça contra os joelhos voltando a ver aquelas imagens passarem pela sua cabeça como se de um filme se tratasse. Podia jurar que estava a ver a cena projectada num ecrã gigante onde ela era a protagonista da peça extremamente violenta e traumatizante.
Sentiu-o agarrá-la e novamente encostá-la à parede, mas desta vez as suas mãos não procuravam macerá-la mas despi-la. Beatriz deixou que duas grossas lágrimas abandonassem os seus olhos em simultâneo. “Isto não me está a acontecer… isto não me está a acontecer…” proferia mentalmente para si mesma, ao mesmo tempo que sentia as suas roupas serem arrancadas do seu curvilíneo corpo. Podia conjecturar os lábios dele no seu pescoço e as suas mãos à volta do seu rabo, apalpando-o sem pudor e com fé de quem estava a gostar demasiado. Sentia-se arder por dentro, estava a queimar-se. A queimar-se com todas as recordações que agora voltavam ao de cima e voltavam a repetir-se. Perguntava-se quem era e que mal fizera noutra vida para merecer aquilo, simplesmente não merecia.

Tom.

Ouvia o nome dele ser pronunciado pela sua mente vezes e vezes sem conta, como que pedindo ajuda mental, mas nada. Ela não arranjava forças para se mover, já Charles permanecia em forma pois Beatriz era agora atirada para cima da secretária, sentindo qualquer coisa afiada espetar-se nas suas costas nuas. Soltou um gemido de dor e as lágrimas voltaram a aflorar-lhe a pele. Estava exausta. Cansada de toda a situação que vivia e de tudo aquilo que já tinha vivido até ali. O sofrimento e a culpa, no seu corpo, andavam de mãos dadas e não queriam saber da felicidade e do amor para nada, mas Beatriz queria. Elevou as costas e o que quer que seja que estava cravado nelas soltou-se, fazendo-a queixar-se novamente. Sentiu Charles beijar-lhe o peito praticamente desnudado e o som do seu coração conseguiu falar mais alto. Não era nada nem ninguém se não conseguisse ultrapassar aquilo! Não era digna de se sentir feliz se não se conseguisse livrar daquele verme! Não era mãe de Ryan nem apaixonada por Tom se aquela tortura não acabasse ali e agora! Tentando arranjar um posição confortável na secretária elevou o joelho acertando nas partes intimas do patrão.
Charles cambaleou vagamente e olhou-a.
- Isso é para quê? – perguntou retoricamente. Beatriz saltou da secretária e arranjou as forças de que necessitava para o empurrar, fazendo-o estender-se no chão. Colocou-se ao lado dele e, visto ainda se manter devidamente calçada nos saltos altos, pontapeou o estômago dele duas vezes e, sem se conter, levou o pé ao sítio a que tinha levado o joelho há instantes atrás, aos testículos. Com Charles a gemer no chão e as suas lágrimas a caírem em cachoeira, a última coisa a fazer era procurar a chave e sair daquele lugar o quanto antes.

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