quinta-feira, 2 de setembro de 2010

[21]

Próximo, segunda (:


Sentir tantos olhos sobre si já era normal. Sentir a baba que todos os homens ali presentes tinham a escorrer pelo queixo já não lhe metia impressão. Saber que todos desejavam uma noite consigo não era novidade, mas saber que ela apenas queria sentir um corpo e, no momento, não o podia ter era demasiado doloroso.
Nunca pensara voltar a sentir-se desta maneira, voltar a sentir aquele nervosismo e as borboletas levantarem voo no seu estômago cada vez que pensasse ou visse aquele alguém especial. Pensara que aquele sentimento teria chegado ao fim para si, mas não. Tom tivera trocado as voltas ao seu destino e, neste momento, Beatriz não se podia sentir mais preenchida do que aquilo que estava. Apesar da distância sentia o coração dele pulsar contra o seu peito de encontro ao varão frio. Conseguia sentir as suas mãos percorrerem o seu corpo e os seus lábios beijarem, ao de leve, o seu pescoço. Sentia-se arrebatar por uma força invisível que parecia consumi-la naquele palco. Algo diferente de tudo o que já tinha sentido. Sentia-se ligada a Tom emocionalmente naquele momento e não tinha resposta para isso. Talvez fosse o seu sentimento a ganhar forma e feitio, talvez fosse outra coisa qualquer. Talvez fosse até quem sabe o início de uma constipação que fazia arrepiar o seu corpo. Não sabia. No entanto, e como que por coincidência estúpida, esse não saber deixava-a a querer não descobrir. Sentia-se firme em si, no seu corpo mas conseguia conjecturar algo diferente na sua alma. Estava irreversivelmente “apanhada do clima”.
Sorriu com os pensamentos que lhe afloraram a mente e saiu do palco. Estava feliz e o facto da razão da sua felicidade chegar aos seus braços no dia seguinte tornava-a ainda mais sorridente.

- Esse teu sorriso estúpido vai começar a denunciar muita coisa. – James sorriu-lhe quando a viu voltar ao camarim do costume.
- Desculpa. – imediatamente assumiu uma postura mais séria. – Tens razão. – sentou-se ao espelho, prestes a retirar a maquilhagem e abandonar o clube por aquela noite.
- Precisas de ter cuidado.
- Hannah? – chamaram-na. Beatriz alarmou-se, afinal se lhe chamavam Hannah aquilo era certamente um cliente, não alguém que a conhecesse ou trabalhasse ali.
- Sim? – respondeu.
- Posso? – perguntou um rapaz jovem, de cabelos compridos e olhos extremamente claros.
- Ahm, és o Georg, não és? – perguntou nem respondendo à educada pergunta do rapaz.
- Sim, sou eu. – sorriu-lhe.
- Procuras alguma coisa? – perguntou com curiosidade convidando-o a entrar e sentar-se.
- Por acaso sim. – disse. – Aquela rapariga loira… a Claire, ela ainda trabalha aqui? – perguntou.
- A Claire… - pensou por alto, não estava a ver quem era. – Ah, sim! Não, saiu a semana passada se não me engano. – disse olhando-o. – Querias estar com ela? – perguntou directamente. Ele riu-se.
- Basicamente ya. Sabes dela então?
- Eu não mas posso perguntar. – saiu por um momento do camarim e foi de encontro a James perguntando-lhe pela tal Claire. Voltou pouco tempo depois com um papel na mão. – Toma, é o número de telefone dela. Liga-lhe. – piscou-lhe o olho.
- Aw, obrigada Hannah! – disse levantando-se abraçando a rapariga.
- Trata-me por Beatriz se faz favor. – pediu com um sorriso.

- HANNAH! – desta vez Beatriz sabia que voz a chamava e, apesar de não ser um cliente que procuraria os seus serviços era aquele que a fazia servir quem não queria.
- Credo, devem mesmo precisar de ti! – disse Georg surpreendido com a pressa e a maneira grosseira com que a chamavam.
- Não me largues! – disse agarrando-se mais à t-shirt do rapaz, fechando os olhos com força e respirando fundo.
- Ok. – ele abraçou-a com a mesma força e, sem saber, esperou que Charles entrasse a matar pela cortina dentro.
- HANNAH! – chamou novamente e, ao entrar, deparou-se com a rapariga agarrada ao pescoço de Georg, o que perante o olhar frio e cruel dele era um cliente como qualquer outro. – Estás ocupada… - a voz dele estava extremamente contente, mas o nojo que fez percorrer as costas de Beatriz não indicavam nada semelhante a bom para ela. - … continua, querida. – saiu com um sorriso vitorioso.
- Falamos depois! – Beatriz fez uma voz algo cansada, ofegante.
Ele soltou uma gargalhada, ainda ouvida no interior do compartimento. Estava agora esclarecido de que Beatriz continuava a fazer o seu trabalho melhor que ninguém, ou pelo menos ele assim fora enganado.

- Desculpa! – largou-se de Georg num instante.
- Não faz mal… é aquele que é o gerente disto tudo? – perguntou pondo o papel no bolso traseiro das calças.
- Ya. – sentou-se bruscamente no sofá, até tinha medo do que raio ele lhe queria. Não era normal ele ir ter com ela a seguir aos espectáculos.
- Estás perturbada… é por causa do Tom? – perguntou sentando-se ao seu lado.
- Sabes o que nós temos? – olhou-o.
- Sim, o Tom contou por alto. – Beatriz suspirou e encostou a cabeça para trás dizendo-lhe o porquê de se ter agarrado a si com unhas e dentes. Charles não podia descobrir que ela se mantinha mulher de um homem só. – E porque não sais daqui? – perguntou-lhe como se fosse o assunto mais simples do mundo.
- Não vai ser fácil… - suspirou dando a entender que não queria mesmo falar do assunto. – Vai ligar à Clarie, pode ser que ainda tenhas sorte esta noite. – sorriu-lhe. – Ela andava encantada contigo, daquilo que eu me lembro. – piscou-lhe o olho.
- Assim encorajas-me mesmo! – riu-se e deu-lhe dois beijinhos abandonando o compartimento.

(…)

- Bill, Bill, Bill, Bill, despacha-te pá estou aflitinho! – Tom andava agarrado às virilhas para trás e para a frente perante a porta trancada da única casa de banho existente no bungalow.
- Estou quase! – Bill falou do interior.
- Se eu me mijo aqui, eu esfolo-te! Ai podes ter a certeza!!! – quase lhe berrou, continuando o caminho, parando ocasionalmente fechando mais as pernas a ver se nada saía de onde não devia. – BILL! – berrou completamente desesperado. – Ai, ai. – suspirava tentando acalmar-se. Bill destrancou a porta e abriu-a, desatando a rir ao observar o irmão naquelas figuras.
- Vais ter um filho e não me disseste nada?! – perguntou indignado, fazendo os olhos de Tom deslocarem-se até si, tal como ele que imediatamente o expulsou da casa de banho, entrando e fechando-se lá dentro.
Bill riu-se ao ouvir um suspiro de alívio.

- Não estejas aí eternamente, temos um avião para apanhar e um jantar marcado! – disse.
- Eu sei que temos um jantar marcado! – respondeu-lhe do interior da casa de banho. – É escusado lembrares-me. – Tom possuía um sorriso nos lábios, era inevitável. Ia voltar para os braços dela, ia voltar a sentir os seus lábios, o seu corpo, o seu toque. Podia jurar que na noite passada estivera com ela algures, mas talvez fosse apenas o sonho que era demasiado real. – Estou pronto!

A chegada a casa parecia ter demorado muito mais tempo do que aquilo que Tom tinha previsto. Talvez fosse o facto de ver o momento pelo qual tanto esperava aproximar-se cada vez mais que fizesse o tempo abrandar devido à sua pressa. Fosse o que fosse tinha-o deixado dormir demasiado pouco, ao contrário do que costumava fazer em todas as viagens de avião que fazia.
- Achas que vá muito produzido? – Bill perguntou, aparecendo à frente do irmão apenas em boxers.
- Han? – Tom não tinha percebido. – Para que é que tu te queres produzido?
- Sei lá, nunca vi a Bea não faço ideia de qual é o estilo dela! Também nunca vi o puto e nunca vi a amiga dela! – refilou.
- Bill, - levantou-se do sofá onde estava deitado e pousou as mãos nos ombros do irmão. – uma t-shirt, um par de calças e uns ténis. – limitou-se a dizer-lhe.
- Isso não é muito descontraído? – perguntou. Tom inspirou fundo.
- Então uma merda qualquer com penas, umas calças de cabedal e umas botas foleiras! – disse olhando-o.
- Isso não é produzido demais? – perguntou levando um dedo ao queixo em sinal de dúvida. Tom riu-se, não porque a situação tinha graça mas pelo nervosismo que se começava a apoderar do seu estômago.
- Desde que não vás nu, acho que podes vestir qualquer coisa que tenhas no armário. – disse-lhe voltando a deitar-se, com os braços cruzados atrás da cabeça. – Elas não se importam com isso. Muito menos o puto. - Bill sorriu, deixando as roupas totalmente de parte, observando apenas o estado do irmão. Tom nunca se tinha sentido assim e achava o sentimento altamente complicado, arrebatador e doloroso. Bill concordava, mas sentia falta disso. Inspirou fundo e voltou ao quarto envergando uma camisa e um par de calças negras conjugando com os ténis e o seu cabelo arrumadinho, como diria o irmão. Voltou à sala e sentou-se no sofá perpendicular ao de Tom, que o olhou.

- Foi difícil? – perguntou.
- Não. – riu-se. – Mas eu não adivinho! – protestou e Tom riu-se.

(…)

- Ryan, dá-me isso! – Sofia corria atrás de Ryan pela casa inteira.
- Não! – o pequeno rapaz ria-se ao ver a rapariga correr atrás de si. Realmente na percebia o que é que uma caixa cheia de cores poderia significar para ela. Parou na cozinha e subiu para cima de uma cadeira, pousando a caixa sobre a mesa. – Mãe! – chamou a atenção de Beatriz que, de avental posto, mexia em tachos e panelas.
- Diz… - ela olhou-o vagamente.
- O que é isto? – perguntou apontando a caixa negra.
- Estás aqui!! – Sofia aproximou-se de Ryan por trás atacando-lhe a barriga com cócegas.
- Aahh! – ele berrou misturando os risos com golfadas de ar. Beatriz parou o que estava a fazer para observar as duas figuras no meio da cozinha, aos risos e cócegas. Sorriu. Adorava aqueles dois, tornavam a sua vida cheia de cor e alegria. Não havia um único dia que não pudesse soltar uma agradável gargalhada com qualquer um deles ou, até mesmo, com os dois como no momento fazia. Apesar de Ryan ter apenas três anos de idade mostrava-se ser demasiado crescido para aquela idade. Beatriz muitas vezes tinha a sensação que ele apanhava demasiadas coisas que, talvez, uma criança normal de três anos não apanharia, achava-o demasiado especial. Ou isso, ou era simplesmente seu filho.

- Posso saber a que se deve a diversão? – riu-se cruzando os braços sobre o peito.
- Este sujeito pequenino roubou-me o estojo da maquilhagem! – refilou Sofia, parando com as cócegas ao pequeno. Já o podia ver demasiado atrapalhado.
- O que é um estojo de maquilhagem? – perguntou Ryan com alguma dificuldade a pronunciar palavra tão grande e ainda cansado com um visível sorriso na cara.
- É isto. – Sofia abriu o estojo e passou o dedo por uma das sombras coloridas, pintando depois ao de leve a mão de Ryan.
- É bonito. – disse fascinado. – É para pôr aqui? – perguntou apontando a mão.
- Não. – disse. – É para pôr aqui. – aproximou-se de Beatriz e apontou os olhos esfumados dela.
- Eu também quero! – disse feliz. Beatriz riu-se.
- É só para meninas filho! – disse. – Normalmente. – acrescentou encolhendo os ombros. Ryan desceu da cadeira e correu até ao quarto, não se importando mais com a conversa ou com o que quer que seja que a maquilhagem era.
- Cheira bem aqui. – Sofia comentou por alto, sentando-se à mesa maquilhando os olhos.
- Precisas de fazer isso aqui? – perguntou Beatriz fechando o forno.
- A culpa é do teu filho. – refilou.
- Pois claro. – riu-se tirando o avental, desvendando o top negro e a curta saia axadrezada avermelhada.
- Vais andar assim vestida e de chinelos? – Sofia falou ao vê-la deslocar-se à sala, arrastando os chinelos azuis e felpudos com umas orelhas de gato à frente. Beatriz parou e olhou para baixo.
- Talvez seja melhor não. – virou a rota e dirigiu-se ao quarto calçando uns saltos altos negros envernizados.

A campainha soou.

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