quinta-feira, 21 de outubro de 2010

[34]

Ora, eu gosto do capítulo mas não gosto do capítulo, torna-se algo importante de facto, mas não é capítulo chave. Próximo, domingo.


Tinha ouvido a voz de Beatriz gritar mas não tinha percebido o que se tivera passado. Certamente a coisa não seria propriamente boa pois quando Beatriz voltou ao compartimento, que todos partilhavam, trazia os olhos inchados denunciando o choro em que estivera. Puxou-a pelo braço até ao seu colo e sentou-a sobre as suas pernas olhando-a simplesmente nos olhos. Ela suspirou encostando o corpo ao seu peito e escondendo a cabeça no seu pescoço. Tom sabia que ela não iria falar, mas não escondeu a curiosidade.
- Estás bem? – perguntou pousando o queixo sobre a sua cabeça, passando-lhe a mão pelas costas. Beatriz acenou afirmativamente com a cabeça.

- Mãe! – Ryan olhara-a e dirigiu-se de imediato a ela.
- Filho! – Beatriz tentou soar normalmente, relembrando que a conversa com Sofia praticamente resolvera o seu problema. Ryan riu-se e tentou subir para o seu colo.
- Hey, não consigo com os dois! – Tom refilou na brincadeira também tentando atenuar o momento e que Ryan não percebesse que se passara alguma coisa.
- Consegues comigo e consegues com ela, por isso consegues com os dois. – Ryan sorriu encolhendo os ombros, naquilo que achava que tinha toda a lógica do mundo. Tom riu-se, aceitando a lógica.
- Vais ser bom a matemática. – Ryan olhou-o, já no colo da mãe.
- O que é matemática? – perguntou. Beatriz riu-se.
- Pergunta à tia que ela sabe. – apontou Sofia.
- Tu é que és mãe dele! – a referida refilou, pegando no comando da playstation preparando-se para jogar a qualquer coisa. – Puto, um jogo? – falou para Ryan. Ele, claro está, saltou do colo da mãe e sentou-se ao lado de Sofia.

*

- E agora vais contar-me? – terceiro dia da Tour, segundo hotel. O quarto do costume.
Tom tentou que desta vez, e em privado, Beatriz lhe contasse o que se tivera passado na noite anterior no Tourbus. Que conversa tinha sido aquela com Sofia? O que é que a tinha deixado naquele estado? O que é que a deixara deprimida o dia todo? Sinceramente tinha o coração pequenino e um aperto no peito. Qualquer coisa lhe dizia que podia ter graves implicações na vida futura da namorada.
- Que aconteceu? – sussurrou passando os dedos por entre os fios de cabelo vermelho que estavam espalhados pela almofada de Beatriz. Inclinou-se sobre ela e depositou-lhe um beijo no pescoço, sentindo-a arrepiar-se. Suspirou quando a ouviu soluçar baixinho e colou o corpo ao dela abraçando-a pela cintura. – Eu estou aqui, Bea. – fez-se sentir, apertando-a mais contra si. – Está tudo bem. – descansou-a.
- Nunca vai estar enquanto ele viver no mesmo planeta que eu. – disse chorosa. Tom não percebeu à primeira. – Charles. – murmurou. Tom bufou.
- Que é que se passou? – perguntou num tom demasiado calmo, surpreendendo-se a si mesmo. Beatriz contou-lhe o que tivera explicado a Sofia. Continuava sem conseguir viver com aquela espécie de culpa que, na forma literal, nem era dela. Ela, e como Sofia lhe dizia com todas as razões do seu lado, não trabalhara lá porque quisera, não tivera uma vida demasiado limitada porque queria. – Bea… - virou-a para si e fê-la fitar os seus olhos amendoados. -  … o poder que ele teve já passou. O poder que algum dia ele exerceu sobre ti acabou. Não volta. – sorriu-lhe. – O cabrãozinho… - quase fez Beatriz sorrir com o termo - … estava no sítio errado na hora em que tu chegaste. Só isso.
- Será? – perguntou-se em voz alta.
- É. – Tom assegurou. – Não me deixes neste estado deprimente quando te vejo assim! – levou o momento para o seu lado mais optimista. – Fico sem graça! – refilou com um sorriso. Beatriz abraçou-se a ele, depositando-lhe um beijo sobre a bochecha.
- Ficas fofinho quando estás sem graça. – sorriu-lhe beijando os seus lábios.
- Vê lá se me fazes corar! – riu-se. Sabia que era quase impossível, Tom raramente corava. Não havia nenhum assunto que ele achasse assim tão tabu ou tão impróprio ou tão íntimo que o fizesse corar. Pelo menos até agora.
- Não é que já não tenha tentado. – sorriu aninhando a cabeça no peito de Tom.
- Ah, mas falhaste. – gozou-a. Odiava vê-la tão em baixo como se encontrava naquele momento. Odiava, por isso gozar com ela e até consigo mesmo era sempre a melhor maneira de lhe pôr um sorriso na cara. Sentiu-a aninhar-se mais. – Vais dormir vestida, Beatriz Blilie? – perguntou.
- Tens problemas com isso, Tom Kaulitz? – retribuiu.
- A partir do momento em que eu também estou vestido e que tu vais adormecer por cima de mim, ya tenho. – olhou-a.
- Chato. – levantou-se num salto e sob o olhar atento e divertido de Tom, tirou a camisa e as calças deitando-se, agora, por baixo dos lençóis. – Feliz? – perguntou-lhe. Tom riu-se, despindo-se ficando apenas em boxers.
- Tecnicamente sim. – deitou-se ao lado dela e abraçou-a pela cintura. – Assim ainda tenho mais contacto pelar contigo. – Beatriz soltou uma gargalhada divertida.
- Pelar?
- Sim, vem de pele. – explicou como se não fosse nada, fechando os olhos abraçando-a mais.
- Só se for da tua pele. – respondeu fechando o assunto, abraçando os braços de Tom com os seus.

(…)

Soundcheck. Ryan, Beatriz e Sofia foram permitidos a passearem-se pela plateia e poderem ver o teste dos instrumentos e dos microfones.
Ryan sentara-se no chão, a ouvir a música e as conversas paralelas que eles mantinham para perceberem se a coordenação existia ou não. Tomava atenção a todos os pormenores que as crianças da idade dele, por instinto, reparavam. Do nada levantou-se do chão e correu até Beatriz e Sofia, que conversavam uns passos atrás dele.
- Mãe, nos meus anos posso aprender a tocar aquilo que o Tom toca? – perguntou e Beatriz sorriu.
- Porque é que não lhe vais perguntar a ele quando acabarem de tocar? – perguntou em resposta. Ryan sorriu.
- Ok. – encolheu os ombros e tomou o seu lugar anterior.

O pequeno fazia 4 anos em pouco mais de uma semana. Beatriz vinha preparada para todas as perguntas e todos os pedidos que ele eventualmente poderia fazer, mas aquele não constava da sua lista. Ryan queria mesmo ser Tom quando crescesse? Teoricamente a ideia agradava-lhe, era sinal que Ryan cresceria com um exemplo masculino, a que já chamava de pai (por vezes), e que não se iria limitar apenas a si. Beatriz sempre acabara por não se martirizar em relação ao facto do seu rebento nascer sem pai. Sempre achou que ter uma referência paterna do sexo masculino não lhe fosse fundamental, mas só a partir deste momento é que pôde praticamente sentir na pele que esse papel tivera feito bastante falta na curta vida do rapaz. Todos precisamos dessa figura, de alguém a quem seguir os passos, e Ryan nunca o tivera. Era claro que tinha a mãe mas para ele não era o mesmo e talvez fosse por isso que o afeiçoamento a Tom tivesse sido tão fácil como foi. Precisava de um exemplo paterno e Tom era o mais próximo que tinha.

- Podes mesmo ensinar-me a tocar isso? – Ryan perguntou esganiçando um pouco a voz para poder ser ouvido por Tom, que se mantinha sobre o palco.
Tom sorriu.
- Se tu queres eu ensino-te! – Ryan olhou à sua volta a ver se alguém conseguia levá-lo até ao palco.
- E como é que vou para aí? – perguntou finalmente.
- Beatriz! Faz o favor de dar uma ajuda ao teu filho! – Tom falou-lhe. Beatriz desviou as atenções até aos dois rapazes e riu-se.
- Sim senhor! – fez continência e Ryan imitou-a, achando o gesto super engraçado. Beatriz pegou nele e entregou-o ao colo de Tom, que o pousou ao seu lado.
- Anda cá. – levou-o pela mão até ao sítio lateral do palco onde guardava as guitarras. Retirou uma das acústicas do suporte e sentou-se no chão, pedindo a Ryan que fizesse o mesmo. – Isto… - apontou o instrumento que tinha nas mãos. - … chama-se guitarra.
- Guitarra. – Ryan pronunciou a palavra com alguma dificuldade. Tom sorriu. Seria possível sentir-se sempre embevecido com aquele puto? Parecia mesmo seu filho. – Como é que sai música? – curioso como os seus anos lhe incumbiam mexeu nas cordas. – Ah! – soltou uma exclamação totalmente fascinado por ouvir som. Tom riu-se.
- Podes fazer assim. – tocou o acorde mais fácil que se lembrava na altura. Ryan mantinha-se no seu sorriso característico.
- Posso fazer eu? – perguntou. Tom sentou-o no seu colo e colocou a guitarra entre os seus braços. – É grande. – olhou bem o instrumento, fazendo a observação. Tom posicionou os seus próprios dedos no braço da guitarra perfazendo um acorde e os pequenos dedos de Ryan entre as cordas no corpo da guitarra pedindo-lhe que os movesse. O pequeno assim o fez e sorriu virando a cabeça na direcção de Tom. – Consegui!
- Pois conseguiste! – se algum dia sonhou com uma situação daquelas era um daqueles sonhos que nunca se tinha recordado ao acordar. Parecia estar a viver num universo paralelo que não era o seu.
O seu mundo, até há bem pouco tempo, resumia-se a concertos, fãs, entrevistas, dormir, comer e viajar. Se nessa altura alguém lhe tivesse dito que iria ter um puto de três anos, filho da sua namorada, sentado entre as suas pernas a tentar aprender como se tocava guitarra pelas suas mãos, porque o pequeno queria ser como ele, certamente diria que esse alguém precisava de tratamento psiquiátrico urgente e que era completamente louco do juízo! Mas não, a situação ocorria na sua realidade e Tom gostava.

Bill preparava-se para sair do palco e dirigir-se ao backstage quando se apercebeu das duas figuras embrenhadas uma na outra agarradas a uma guitarra, sentadas no chão. Por momentos até pensou estar a sonhar, aquilo era tão enternecedor que Bill julgava mesmo estar noutra dimensão também. Cruzou os braços e com um sorriso deixou-se observar a cena com atenção.
A atenção e delicadeza com que Tom lidava com Ryan, a maneira como o próprio pequeno se sentia tão à vontade com o seu irmão davam-lhe um desejo parvo de ter filhos. “Tem juízo, Bill!” disse a si mesmo, por muito bom que fosse não estava na idade disso. Bem, o seu irmão também não mas certamente tinha muito mais jeito com crianças que ele. Aliás sempre teve. Bill adorava crianças de uma maneira estupidamente parva e fofinha, mas ter mãos para elas e para as suas brincadeiras e perguntas, admitia que não era bem assim afinal, a sua paciência era já por nascença extremamente curta. Já Tom era o contrário, nunca achara muita piada a crianças mas sempre tivera jeito com elas, sempre teve mais paciência para aturar os primos de ambos que ele. No final das contas até que a figura adorável que tinha à frente dos olhos fazia sentido, e acima de tudo os sorrisos e gargalhadas que Tom emitia pareciam muito mais sinceras que o normal.

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